Arquivos e Ruínas
por Daniel Pereira
A fotografia tem papel determinante nas formas modernas de registros fundamentais na lógica documental pública do Estado, ocupando gavetas e estantes dos arquivos públicos. Justamente nesse transcurso da pesquisa, tivemos a possibilidade de vivenciar o arquivo público da cidade de Olinda, que aqui seria o lugar onde encontramos fragmentos de uma documentação imagética que nos fez conhecer mais dessas ruínas que estão vivas nesse lugar, que segue na missão de cumprir precisamente seu papel de preservação e circulação da memória.
As imagens fotográficas, em sua permanente função dada de eternizar momentos, sejam eles recortes editados ou não, são também instrumentos de “ressuscitar mortos”, assim como disse Roland Barthes. De acordo com o filósofo, nós podemos olhar a imagem e falar “eu estou vendo um morto”.
As fotografias são recortes do que já foi, do que ficou imortalizado através da fixação de imagens na superfície de variados materiais e hoje, predominantemente, no digital. Sendo assim, as fotografias de arquivos sobre ruínas ou restos do que existiu são também remanescentes de algo que caiu em desuso? Pensando a partir da ideia de ruína como sendo resíduos ou fragmentos, seriam as imagens fotográficas impressas e localizadas em uma coleção ruínas de nossas memórias que guardam vivas essas paisagens ou esses objetos como já antes foram?
Ressignificaremos nossas memórias ao nos depararmos com informações, dados e saberes sobres os monumentos que têm seus restos ali. Esses “restos” ou sobras são dados determinantes para uma pequena noção estética da ruína, ao mesmo tempo em que incluem também noções dos seus usos, sociais e naturais (agora pela natureza).
Esse espaço e seu surgimento e manutenção como o espaço que conhecemos hoje estão diretamente ligados e fortalecidos pelo título de patrimônio da humanidade concedido a Olinda pela Unesco há 40 anos, em 1982. E esses apontamentos e achados nos podem também dar caminhos sobre as relações dessas ruínas com a vida social da cidade, aqui partindo da visualidade das imagens fotográficas, sua polissemia e o que tem de político nesses recortes que nos falam de expansão, território e sociedade.
Essas imagens de arquivo trazem também o encargo de nos referenciar ao buscarmos entender algo sobre memórias, individuais e coletivas, dessa borda do continente com o mar. As imagens como fontes materiais e referências para se buscar entender mais sobre o imaginário coletivo e os individuais também.
Porém, a polissemia das imagens pode nos colocar numa situação (aqui muito bem-vinda) bem peculiar para ajudar a interpretar os símbolos desses restos, do que ficou deles até o que temos agora. Esses pontos de localização geográfica dos resíduos e resquícios nos ajudam a construir uma cartografia das ruínas e das memórias de determinadas materialidades.
Diversos tipos de recortes imagéticos com distintas funções ajudaram e oportunizaram essa pesquisa, como, por exemplo, imagens das ruínas e construções da orla no contexto da modernização de Olinda e do fenômeno do avanço do mar (presentes no acervo do arquivo público) que se juntam às fotografias produzidas sobre as paisagens de hoje dessa mesma orla e do registro de impressionante acervo de peças, encontradas nesse mesmo território de margem de praia, do pesquisador Ted Greiner.
A cultura dá sentido a significados estéticos e os arquivos fotográficos são, sem dúvida, uma orientação e opção para esse caminho.